No baralho do tempo vejo as pipas da
minha infância colorindo o meu céu; nelas posso perceber o quanto é necessário
deixar a imaginação viajar...
Olhando para o lado vejo eu
rodeado de amigos jogando gude e tive a sensação que cada uma delas representa
uma lágrima que deixei cair teimosamente...
Nessas idas e vindas resgatei a
pureza de um tempo que não volta mais, mas que faz muita falta... Como era
desafiador o jogo do baleado onde ficávamos enfileirados em lados opostos para
ver quem conseguiria chegar ao fim, uma batalha que todos saiam vencedores e o
que mais importava era a alegria coletiva, uma algazarra geral onde o tempo
passava sem percebermos...
Quando chovia já eram tradicionais
nossos banhos nas ruas, aproveitávamos as enxurradas que faziam umas cachoeiras
em frente das casas e ficávamos deitados como se fossemos folhas seguindo o
percurso das águas...
Com o chão molhado jogávamos triângulo, onde a cada desenho geométrico que conseguíamos fazer era um troféu
conquistado.
Assim passávamos nossos dias,
entre bolas, triângulos, gudes, pipas... à noite quando nossos pais pensavam que iríamos nos acalmar, saiamos batendo nas portas dos nossos vizinhos e nos
escondíamos para vermos chegarem até a porta e não tinha ninguém, e a cada ida
eles gritavam feito loucos nos xingando com nomes que só naqueles tempos
existiam como: cabrunku, estopor, desgraça entre tantos outros.
Nas noites enluaradas ouvíamos rodas
de cirandas cantadas pelas garotas sentadas nas esteiras feitas de palhas em
frente de suas casas e o refrão que guardo até hoje é esse: ”eu morava na areia
sereia, me mudei para o sertão sereia, aprendi a namorar sereia, com um aperto
de mão o sereiaa...”.
Foram tantas brincadeiras
eternizadas em minha memoria, que povoam o meu imaginário e as vejo nitidamente...
Amarelinha, guerror, esconde esconde , cabra cega , pega vareta, curral com
ossos de animais, colecionar figurinhas, pular corda, pião, pintalainha ... Enfim são
momentos únicos que estão memorizados, queria imensamente que essas novas
gerações redescobrissem a inocência dessa época, mas a realidade de hoje são
nossas crianças presas em casa, em frente ao televisor ou quem sabe no
computador, brincando sozinhas com elas mesmas, deixando a alegria encarcerada,
enjaulada, encurralada, tornando-se seres egoístas. Como queria voltar ao tempo
e espalhar em minha volta essa alegria despreocupada da juventude onde o
alimento da alma era unicamente a euforia das nossas eternas brincadeiras.